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segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Epopeia Paraguaia

Existe uma vertente do jornalismo que é chamada de gonzo. Seu princípio é abandonar a objetividade e a seriedade do jornalismo tradicional, deixando a parcialidade da imersão do repórter tomar conta do texto, normalmente mais voltado à literatura que ao periodismo. O estilo foi criado nos EUA (sempre eles) pelo jornalista Hunter S. Thompson que, entre vários textos tresloucados, escreveu o genial “Medo e Delírio em Las Vegas”, lançado no Brasil como livro em 1984 pela editora Anima e que virou filme em 1998. Por aqui a obra “Henfil na China – antes da Coca-cola”, do cartunista Henfil, é um perfeito exemplo do estilo.

Ensaiei algumas experiências gonzo durante o tempo que passei trabalhando em navio e mantive um blog na internet (www.meditoerrando.blogspot.com). Dessas tentativas resultaram alguns textos bacanas como o dia que não vi o Grande Prêmio de F1 de Mônaco e a decepção que tive com os “corpos petrificados” pelo Vulcão Vesúvio no sítio arqueológico de Pompeia, na Itália. Mas há tempos que não tinha oportunidade de fazer uma matéria com ponto de vista interno. Período que durou até o último final de semana quando recebi o convite dum amigo, dono de uma loja de produtos importados, para acompanhá-lo ao Paraguai fazer umas compras para o Natal. Embarquei na viagem com expectativa de contar minha experiência como sacoleiro, algo que farei em dois capítulos para não ficar muito maçante e também pela limitação de espaço.

Pegamos o ônibus na sexta-feira, com mais de uma hora de atraso, no trevo da BR-280 em Mafra. Fazíamos parte de uma caravana de veículos lotados de passageiros divididos em experientes, inexperientes e curiosos, nesse último caso, eu. A viagem é longa, mais de 10 horas, mas não chega a ser cansativa na ida, pelo menos não se você tem Rivotril na mala. Existe uma certa tensão no ar por conta dos assaltos que ocorrem na estrada aos ônibus de excursão o que, felizmente, não nos ocorreu. Apesar dos detestáveis filmes de pseudo-comédia colocados no DVD pelo nosso guia, que chegou ao cúmulo de, na volta, tocar um show de Jorge & Matheus, consegui dormir. Aliás, conforto não é o forte desse tipo de viagem. Nossa primeira e única parada antes do Paraguai foi em Santa Tereza do Oeste, em um posto de gasolina de aparência duvidosa onde descemos para usar o banheiro e comprar algo na lanchonete. Impressionantemente às cinco da manhã já havia um torneio de sinuca no local e o prêmio era um leitão inteiro que estava pendurado ao lado da mesa de fichas (morto, óbvio). Na verdade, acho que presenciamos o final do torneio, uma visão tarantinesca, pois, além de uns bêbados concentrados na disputa, havia também algumas prostitutas oferecendo serviços aos jogadores e plateia.

Chegamos ao Paraguai às sete horas. A Cidade Del Leste é suja e, com a pouca luz da manhã nublada, é pouco amigável. Lembra bem os filmes do Van Damme passados em Bancoc no início dos anos 90. O comércio abre cedo, por volta das 6h, e nesse horário já existem muitas pessoas nas ruas com disponibilidade para tudo: alguns para carregar malas, outros fazendo serviço de guia para te levar às “melhores lojas” por uns trocados e alguns para te assaltar também, por que não? Os nativos só falam entre si em guarani, uma forma de preservar o teor das conversas que te irrita quando você está negociando com eles. Algo perfeitamente desnecessário porque o seu espanhol é tão incompreensível quanto o próprio guarani. A Vânia, uma simpática vendedora que me atendeu, explicou que o idioma é mais comum entre a parcela mais pobre da sociedade, que mantém mais a tradição da língua dos antepassados. Ela mesma disse que falava muito pouco de guarani, mas entendia quase tudo. Seu português, contudo, era exemplar. Os paraguaios dessa região de fronteira, aliás, falam muito bem a nossa língua o que facilita, em muito, a vida dos sacoleiros.

Passadas as impressões iniciais fomos às compras, porém, como já comentei acima, a continuação da minha epopeia paraguaia acontecerá na próxima coluna porque muita coisa naquele lugar é peculiar e chama a atenção, algo que não conseguiria contar em uma edição. Resumir histórias, afirmo, não é minha especialidade. Continuo na próxima semana.

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