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quinta-feira, 18 de junho de 2009

Porque a televisão me deixou burro, muito burro demais

É impressionante o quanto a TV decepciona a gente. Eu me lembro claramente de um documentário que assisti sobre as centenas de corpos conservados pelas cinzas da cidade histórica de Pompeii, destruída em uma erupção do vulcão Vesúvio no ano 79 depois de Cristo. Por anos mantive na memória a imagem extraordinária das pessoas carbonizadas pelas cinzas quentes, na maioria mortas antes mesmo da chegada da fuligem, graças à nuvem de gazes tóxicos exalados durante a erupção.

Lembro que assisti ao documentário pouco tempo depois de ver pela primeira vez o VHS do Live at Pompeii, que me deixou tentado a conhecer o lugar. Não via nada mais incrível que o som do Pink Floyd ecoando por uma cidade fantasma encravada no vale de um vulcão assassino. Por anos sonhei com esse encontro.

Como todas as semanas ancoramos em Nápoles, distante 30 km de Pompeii, essa semana ajustei minha agenda e resolvi cumprir um daqueles itens que se coloca na lista de coisas para fazer antes de morrer (a minha tem diminuído drasticamente, isso me preocupa). Fui com o grupo ítalo-espanhol de excursão da MSC. Saímos por volta das 8h30 rodando por uma estrada que liga as duas cidades ouvindo atentamente as informações do guia. Interessante descobrir que foram mais de nove cidades destruídas pelo Vesúvio naquele fatídico ano, sendo que uma delas, Ercolano, foi totalmente coberta pela lava. Hoje no local uma nova Ercolano foi reerguida sobre a montanha que se formou sobre a antiga. Já Pompeii era a maior de todas e também a mais distante, 13 km ao sul do vulcão, que expeliu lava apenas na face oeste. A cidade era o principal porto da região, por onde passavam mercadores de várias partes do mundo.

Na época Pompeii ficava a 1,5 km do mar Mediterrâneo. Hoje fica a mais de cinco, graças a um fenômeno que acontece na região, que também é responsável por algumas aberrações como um monte de 40 e poucos metros que dizem ter surgido da noite para o dia. Lógico que botaram uma igreja no alto dele!

Na erupção estima-se que morreram mais de cinco mil pessoas, as últimas que demoraram a fugir da nuvem de gás, expelida durante o segundo dos três dias de atividade matadora do Vesúvio, até hoje considerado um dos cinco vulcões mais perigosos do mundo por continuar em atividade e ter a sua principal cratera fechada por toneladas de rocha. Uma bomba relógio!

Didática a parte e voltando ao meu sonho floydiano de conhecer Pompeii confesso que estava até eufórico com a realização. Cheguei ao lugar ouvindo o Live at Pompeii esperando encontrar pelas ruas quaisquer “Echoes” setentistas. Contudo, a quantidade de turistas falando alto e gritando acaba com a possibilidade de se ouvir qualquer coisa. Às vezes não se escuta os próprios pensamentos. As ruínas são fantásticas, embora bem diferentes do que eu imaginava. Por estar com o grupo não tive a liberdade de andar curtindo as coisas que me pareciam mais interessantes.

Depois de mais de duas horas cameleando debaixo do céu sem nuvens do sul da Itália, e já cansado das piadas sem graça do Romano, nosso guia, um professor de história que não parava de fumar um charuto dos mais nojentos que já vi (era fácil não se perder, bastava seguir o olfato), chegamos à esperada zona dos corpos preservados. Não faço o tipo que gosta de ver desgraça e carne moída, normalmente passo de cabeça virada em acidentes na estrada, mas estava ansioso por ver uma maravilha macabra esculpida há mais de dois mil anos pela própria natureza. Entretanto, um pouco antes de sair da Via dell' Abbondanza, uma das principais ruas de Pompeii, o guia nos chamou e revelou que na verdade não existem nem nunca existiram corpos preservados , mas apenas moldes de gesso, feitos por meio de uma técnica que introduziu o material nas formas deixadas pelos cadáveres prensados entre duas camadas de cinzas condensadas do vulcão.

Não precisa nem comentar a frustração com a qual fotografei os tais moldes nas caixas de vidro. Tudo bem que isso é uma relíquia, até porque não são estátuas, mas imagens esculpidas pelos próprios mortos, uma vez que os arqueólogos apenas usaram tubos de vidro para injetar o gesso nas fendas, mas a graça não é a mesma. Senti-me completamente enganado. Se tivesse pago a entrada acho que teria vontade de pedir o dinheiro de volta (o ticket para o parque arqueológico custa 11€, não paguei por hipoteticamente estar a trabalho). Como os documentaristas puderam mentir dessa forma? Beira a canalhice. Senti-me um marido traído, daqueles que quase choram e no final acabam achando graça da coisa. Pior é que nem pude ir ao anfiteatro onde o Floyd tocou porque fica muito longe do percurso principal dos turistas (Pompeii tem aproximadamente 4km²). Mas isso eu compenso na próxima ida, que não deve demorar, graças a Deus as ruínas, diferente do GP de Mônaco, não acontecem apenas uma vez no ano.

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